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O ponto de interrogação é escusado, a resposta parece óbvia, a blogosfera parece uma peça do museu digital, e apenas eu, que ainda mantenho um blog com menos assistência do que uma palestra sobre a tradição doxográfica em Empédocles, é que ainda não se deu conta disso.
Contudo, se há incomparavelmente mais “consumo” de informação na rede do que havia no auge da blogosfera, não deviam ser os blogs mais populares do que nunca? Atentemos algumas estatísticas actualizadas sobre o crescimento dos blogs:
- 409 milhões de pessoas acedem, por mês, a mais de 20 biliões de páginas;
- Nos EUA, entre 2014 e 2020, o número de bloggers aumentou em 10 milhões;
- Por mês, são produzidos cerca de 70 milhões de novos postos e cerca de 70 milhões de novos comentários;
- 77% dos utilizadores de internet consomem blogs;
- o WordPress suporta 39.9% de todos os sites.
Estes números não são um prenúncio de morte, mas de mudança, se se comparar aquilo que é blogar nos dias que correm.
Uma determinada forma de blogar, pessoal, confessional, dispersa nos assuntos, foi, em poucos anos, exilada para os subúrbios da internet, onde permanece anónima. As redes sociais de consumo rápido tais como Facebook ou Twitter, desviaram a audiência dos blogs, onde as publicações são mais fácil de digerir, sendo a reflexão longa reduzida a algumas frases, som e imagem.
Porém, esta concorrência é apenas uma parte da explicação. Os bloggers de antigamente dispersaram-se por outras plataformas: podcasts, canais de youtube, instagram, twitter, etc; muitos profissionalizaram-se, montaram um estúdio, um cenário, contrataram pessoal, investiram em equipamento de áudio e vídeo, elaboraram um conceito e sabem como apresentá-lo.
Surgiram novos segmentos, já especializados em temas, orientados a um público-alvo já definido, tais como o Everything Music do Ricky Beato, o Doug Elvering ou o EytschPi42 , estes dedicados a música ou a equipamento musical, mas os nichos são variados, o horizonte alargou-se.
Não contesto esta transformação, a internet é volátil pela sua natureza, mas causa-me alguma decepção a zona de guerra em que se transformou – dark web à parte – e na horda de moralismos que se ergue para a controlar. Dois muros que emparedam a liberdade.
Decepciona-me a consciência de marketing tomou conta do blogger que passou da reflexão para a “produção de conteúdos”, aquilo que um marxista chamaria de mercantilização (ou comodificação, aportuguesando o original inglês); de facto, segundo as estatísticas, 27% dos bloggers preocupam-se mais com o marketing do que com o conteúdo. Há uma mal-disfarçado esforço para agradar. Esta tendência é uma pauperização da blogosfera.
Tenho saudades da pessoalidade dos blogs; a dispersão dos temas nada mais reflecte do que a intrínseca fragmentação de cada um.
Escrever e publicar não é a manifestação de um ego inflamado que procura ser celebrado, ou de uma insegurança que procura validação; tal concepção reduz a ontologia humana à mera vaidade: escrever é construir no espaço entre nós, estamos condenados ao outro.
Posto isto, é minha intenção, que este blog, no futuro, sofra alterações. Quais? Ainda não sei.