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…condutores e transeuntes têm de responder ao tribunal dos media – “fiscalização musculada”, eufemismo de um jornalista-poeta, um dos… -, dar a devida satisfação por não estar “confinado”, por não obedecer. A vã glória de mandar, a unanimidade cessa o debate, fala-se em junta de salvação. Não há populismo mais venenoso do que o consenso bruto. “Vamos a factos, isto pode ficar muito pior”, dizem.
Tenho a impressão que em todas as épocas vigora a mesma sentença: os contemporâneos sempre afirmam viver os tempos mais iluminados, somos melhores que os anteriores. Os telejornais partilham aqueles 10 minutos finais, outrora ocupados por pandas nascidos em cativeiro, para nos entreter com os bonecos dos tempos de hoje.
Trump e Bolsonaro são os instigadores dos zelotas da virtude lusa. Uma vez relatadas as tropelias nos EUA em modo ligeiro (em tempos perguntava-se a um texano se conhecia Lisboa, sendo a sua ignorância matéria de geografia prova suficiente da nosso própria inteligência), é estabelecido o protocolo com a audiência, estamos todos no mesmo lugar, viajemos juntos, pois somos os bons da história, os virtuosos. Firmado o protocolo, constrói-se a ideia, estamos num território armadilhado por esta bonomia colectiva que não admite o desvio, há uma razão inexpugnável à qual temos de aderir, não seríamos patriotas, “tens uma ideia melhor?”. No bolso de Portugal entrou dinheiro da Europa, na cabeça entrou o pior do empirismo anglo-saxónico através da cultura pop, o vício da prova, o desprezo pela ideia pura; somos uma criatura híbrida que tem a sua maior virtude o instinto reptiliano de sobrevivência e uma geografia favorável que desmotiva a invasão.
Um breve exemplo do equívoco: nestes dias, sempre se apresenta os EUA como o país onde se conta o maior número de casos de covid, todavia, relativamente à população, o índice por milhão de pessoas está muito abaixo da Espanha, os nosso vizinhos.
“Estás a defender o Trump, é isso? E o Bolsonaro?”, a própria pergunta contém em si a semente do problema que assola. Temos medo das perguntas porque já conhecemos as conclusões. Para se criticar estes patuscos líderes, é preciso aderir à verdade – e eles encarregam-se de fornecer tanto material, que os humoristas nem conseguem encontrar ângulo tal o espanto da realidade -, o que necessita de auto-crítica, humildade epistemológica, sobriedade ideológica, e é esse o exercício que não vejo na maioria dos actores mediáticos.
Eu só queria ver as árvores a florir.
Imagem daqui.