Portugal arde. O Minho, mais uma vez sofre danos irreparáveis. O parque da Peneda-Gerês, um dos sítios mais bonitos que já vi, cobre-se de negro em larga extensão. E tal como em anos anteriores, era uma questão de tempo até haver calor suficiente, e alguém detonar mais um incêndio numa qualquer floresta, propagando-se pelas outras como uma espécie de doença contagiosa. Fenómeno que me desperta uma curiosidade macabra, este da motivação dos pirómanos, ou daqueles que por qualquer razão de índole mais grosseira, um qualquer interesse económico. Esses não são o problema, apesar de serem sentenciados com uma pena que vai desde o “era manda-los pró meio do fogo!” até ao “havia de ser no tempo do Salazar, havia!!”, juízes ainda intoxicados pelo fumo, quer seja ele proveniente do incêndio que arde por detrás das suas casas, ou por aquele que arde na cabeça dos portugueses desde sempre. Talvez seja no coração que lavram as chamas, caso ainda mais grave e irreparável. (O sarcasmo é a forma mais fácil (cobarde) de fazer humor. Considere-se esta frase como a errata deste post).
O ministro aparece na televisão com ar pesaroso, fala do “flagelo que são os incêndios”. Os bombeiros aparecem exaustos. As pessoas aparecem com uma panela cheia de água para atirar por cima das labaredas. Os restantes vão fazendo zaping de canal em canal, cada um com a sua versão da catástrofe, entretanto há um partido que faz campanha e outro que defende que “que as pessoas que têm capacidade activa (os subsidiários do rendimento mínimo) para o trabalho o façam limpando matas, limpando florestas públicas”.
Há muita gente nas câmaras municipais e governo, com a responsabilidade de lidar com este assunto. Não os acuso de nada. Não acuso as acções de ninguém, apenas as ideias. Nos ministérios e divisões (ou lá como se chamar essa parte dos governos) do ambiente, há sempre gente muito idealista (sem ironia). Pessoas que realmente querem ajudar. Neste momento da minha vida, encaro o idealismo como uma motivação que se deve ter imediatamente a seguir ao despertar pela manhã, apenas para encarar o resto do dia. Os nossos ideais, vistos pelos outros, são armas de ataque com um aspecto muito agressivo. Quero com isto dizer que, defender causas que despertam paixões terá de ser feito de uma forma racional.
Não questiono o valor da Natureza, nem sei bem definir concretamente esse valor. Faz sentido todo o ciclo natural, é perfeito, interferir com ele é para mim um acto quase de cariz religioso, carece de autorização dos deuses. Mas, eu não tenho filhos, não preciso de ir à caça para lhes dar de comer, posso-me alimentar do quintal, até passar fome. Não posso é esperar que os outros partilhem o mesmo sacrifício comigo. Nem os mesmos ideais.
O projecto que a AFL e outras associações florestais estão a implementar, as Zonas de Intervenção Florestal (ZIF) são a única forma de minimizar o problema. Não é com penas pesadas para os incendiários que se resolve alguma coisa. Já falei anteriormente disto, as ZIF são definidas como “áreas territoriais contínuas e delimitadas, constituídas maioritariamente por espaços florestais, submetidas a um Plano de Gestão Florestal e a um Plano Específico de Intervenção Florestal e geridas por uma única entidade.”
Já se percebeu que as pessoas não vão “limpar” as matas. Que não têm os conhecimentos (ou não querem, nem têm essa obrigação) para plantar as árvores adequadas ao terreno. A moda dos eucaliptos está a ter consequências graves na nossa floresta, é uma espécie forasteira que não é adequada ao nosso terreno. Também os proprietários foram encorajados a planta-los, cresciam depressa, rendem muito dinheiro, resistem melhor que os pinheiros, o que é que pode correr mal? É este tipo de coisas que eu ouço, imediatamente antes de me acusarem de ser conservador. Sem ofensa, claro.
Apenas com um plano de intervenção em zonas de pequena dimensão, gerida ao microscópio, sem as megalomanias e vassouradas do costume, é que se consegue recuperar e conservar o património. Isto demora tempo, muito tempo, coisa que nós não temos nem damos.